sexta-feira, 17 de abril de 2009

Festa dupla

Foi uma festa no Domingo de Páscoa, na aldeia onde nasci, Aveloso, no concelho de S. Pedro do Sul.
Para além do dia festivo, em função do calendário, foi o dia do meu aniversário.
"When I'm sixty four", lembram-se? Pois é, já cá cantam. E como estavam longe nessa altura... Era uma meta que poucos atingiam. Como cá cheguei, acho que se justificou a festa com bolo, velas, parabéns a você e, fundamentalmente, com a família reunida, embora com algumas ausências irrecuperáveis.
Curiosamente, esta data de aniversário é partilhada com dois outros elementos da família, um primo direito, dezoito anos mais novo, e uma priminha de 2ª geração, que fez quatro anitos.
Inevitável lembrar as Páscoas de criança e adolescente. Era costume passarmos esta época em casa dos meus avós paternos. Como ficaram seis filhos (dos nove que houve), havia muitos netos. Quando o "Sr. abade" se fazia anunciar com a campainha, lá íamos todos às casas dos tios (corríamo-las todas) para "beijar o Senhor" e comer umas amêndoas, pão-doce e outras iguarias da época (lembro especialmente o pão-de-ló "molhado", cuja receita, felizmente, foi adoptada por uma das minhas primas, dando-nos a oportunidade de continuar a tê-lo no dia de Páscoa); depois, seguíamos atrás da "comitiva" que acompanhava o padre, em que cada elemento tinha a sua tarefa: um levava a cruz, outro a água benta, outro o sininho, outro recolhia as dádivas dos paroquianos. Todas as casas estavam abertas à espera do Senhor.
E havia sempre a distribuição dos "folares" dos padrinhos, cuja designação era a tradicional, mas o conteúdo não. De facto, em vez dos folares-bolos, eram prendas de natureza variável e até dinheiro. Para além da prenda dos padrinhos, como um dos tios estava emigrado no Congo Belga, a avó Maria distribuia vinte escudos a cada um, resultante da divisão por todos os sobrinhos da quantia por ele enviada. Era uma festa!
Enfim, era um dia em cheio, particularmente para os mais pequenitos.
Já adolescentes, deixámos de integrar a comitiva e, antes da Páscoa, aproveitávamos o facto de sermos muitos para fazermos uns bailes na cozinha velha da casa, desactivada, toda negra do fumo de outrora, com muitas teias de aranha, produzindo um ambiente mágico em que as vozes do Adamo, do Tom Jones e de outras "jóias" da época, reproduzidas no gira-discos ou no gravador de fita, completavam um ambiente de contrastes. Era a nossa discoteca privativa, um pouco provocatória na aldeia (em 6ª feira santa, imaginem!), mas lá nos perdoavam o "pecado".
Hoje as coisas estão diferentes. Já não há padre residente, pelo que são os leigos a levar o Senhor e, os mais conservadores, ainda que crentes, zangam-se e não abrem a porta. Aliás, poucas portas há para abrir, já que os habitantes são cada vez menos; valem os que querem manter a tradição e vão lá passar a Páscoa.
Mas continua a haver amêndoas (algumas sem as ditas, mas com chocolate), pão-doce, pão de ló e cabrito assado como prato indispensável. Mas, mais indispensável, é a reunião da família. E essa, conseguimos.

2 comentários:

Rosa dos Ventos disse...

Que bela Páscoa a tua!
Quando era miúda também saltitava da casa dos avós para casa dos tios atrás do Sr. Prior, mas ficava-me por ali, não ia mais longe!
Por aqui com a organização familiar dispersa, festejámos os três, olhando para os lugares irremediavelmente vazios...
Mas, apesar da pouca crença, abrimos a porta ao Senhor!
Calhou-nos um padre estrangeiro!
Ainda não chegámos aos leigos...:-))

Abraço e até breve

César Paulo Salema disse...

Que bom ler a sua Páscoa.
E parabéns pela primavera do 12.
Bj
P